10.9.09

Foucault - O Pensamento, a Pessoa





Colecção: Pilares, n.º 4
Formato: 16 x 24 cm
N.º de páginas: 160
ISBN: 978-989-95884-9-3
PVP: 18,00€ (IVA inc.)


Michel Foucault e Paul Veyne. O filósofo e o historiador. Duas grandes figuras do mundo das ideias. Dois inclassificáveis. Dois «intempestivos» que muito tempo caminharam e guerrearam juntos.
Paul Veyne traça aqui o retrato inesperado do seu amigo e relança o debate sobre as suas convicções. Afirma a dado passo: Não, Foucault não é aquele que se julga ser! Nem de direita, nem de esquerda, não jurava nem pela Revolução nem pela ordem estabelecida. Mas, justamente, como não jurava pela ordem estabelecida, a direita regurgitou-o, enquanto a esquerda acreditou que bastava que ele não jurasse pela ordem estabelecida para que fosse de esquerda. Também não era o estruturalista que dele se disse ser, mas sim um filósofo céptico, um empirista próximo de Montaigne que nunca cessou, na sua obra, de se interrogar sobre os «jogos de verdade», verdades construídas, singulares, próprias a cada época.
Não se poderia ser mais assertivo do que este texto no que toca às ideias que se julgam de vanguarda e não passam de heranças do passado. Um livro iconoclasta, um testemunho único.


Paul Veyne apaixonou-se por arqueologia e história com a idade de oito anos e desde essa altura passou a visitar assiduamente as colecções romanas no museu de Nimes,, o que o ajudou a fixar a vocação de historiador.
Membro activo dos meios intelectuais franceses, conviveu com figuras como a de Foucault, de quem se tornou amigo próximo. Entrou em 1975 no Collège de France (com o patrocínio de Raymond Aron), onde esteve em actividade até 1998 como titular da cadeira de História de Roma, e onde ainda lecciona como professor honorário. Deste autor está já publicado um título na mesma colecção: Quando o nosso mundo se tornou cristão.


Excerto:

«O foucaultismo é uma crítica da actualidade que se abstém de ditar prescrições para a acção, mas que lhe fornece conhecimentos. O que, no ano da sua morte, o levou a propor uma nova concepção da filosofia cuja paternidade ele atribui a Kant (mas pensava nisso havia já quinze anos, como demonstra uma página hesitante da Arqueologia do Saber). Num opúsculo intitulado Qu’est‑ce que les Lumières?, o filósofo alemão da época das Luzes procurava caracterizar o seu próprio tempo. O Aufklarüng aí se designa a si mesmo Aufklarüng; os homens de um certo século, o XVIII, puderam dizer «nós outros, homens do século XVIII e das Luzes», e sentiram‑se diferentes dos seus antepassados. Kant não procura caracterizar a época em que viveu em si mesma: ele «procura uma diferença: que diferença hoje introduz em relação a ontem?».
Segundo Foucault, o que entendemos por filosofia poderia, doravante, não consistir já em fazer cientificamente a exegese do passado nem em pensar a totalidade ou o futuro, mas em dizer a actualidade e, à falta de melhor, caracteriza‑la negativamente, «diagnosticar o presente, dizer o que é o presente, dizer em que é que o nosso presente é diferente e absolutamente diferente de tudo aquilo que não é ele». O nosso autor já não concebe outra filosofia possível além desta crítica histórica; fora dela não há nada que valha na nossa época: «O que é, pois, a filosofia hoje – quero dizer a actividade filosófica –, se não for o trabalho crítico do pensamento sobre si próprio?». Como já se viu, pensamos, em cada momento, no interior de um discurso que não se pode conhecer a si próprio, mas que permite pelo menos constatar que pensamos diferentemente do que pensaram os homens de outrora. Melhor ainda, bastará que se forme o projecto de uma genealogia ou de uma arqueologia e que se manifeste a possibilidade desse recuo, para que nos reencontremos à distância de nós mesmos e do nosso hoje. Este projecto escava debaixo de nós um abismo: «nós somos diferença» e não sabemos mais do que isso. Semelhante iniciativa de diferenciação é mais do que história, merece o nome de filosofia porque é, negativamente, uma reflexão sobre nós mesmos e também porque incita a reagir. Efectivamente, a história arqueológica semeia a dúvida; doravante uma fissura, uma «fractura virtual», listrará o nosso eu bem como as nossas evidências: não lhes toqueis, estão quebradas. Ou, pelo contrário, tocai‑lhes, se decidis faze‑lo: a nova filosofia em questão é «a história indispensável à política.»

(págs. 123-124)